segunda-feira, 25 de junho de 2012

MIDDLE AGE

Acordei com o uivo da loba. Aquele uivo quente, que provoca arrepio na nuca, de tão próximo. E o despertar foi muito maior do que simplesmente abrir as pálpebras. Acorda-se aos 40. Acorda-se de fato. Daqui em diante tudo é como é, sem grandes elocubrações . Ganha-se tanto, ao olhar o mundo aqui de cima, que digo que pouco quero saber sobre o que se perde. O que é perdido é o inevitável. E você perde exatamente aquilo que não precisa. Perde-se o desnecessário. É fato que perde-se também um certo encantamento, que é justamente recompensado pela certeza de que o contentamento também tem grande valor. CONTENTAR-SE é o sal da vida. É dar a si aquilo que é necessário pra se aproveitar ao máximo aquilo que se tem. Contentar-se é um bálsamo, quando o afastamos do sentido medíocre que muitas vezes atribuímos a este nobre estado de espirito. Contentar-se é estar alinhado, equilibrado, pleno. Alguém contente, é alguém que explora o que vem, de acordo com o que deseja. Alguém que percebe que o valor do "estar bom", é muito mais doce e proveitoso do que o eterno insatisfeito, "poderia ser melhor". E contentar-se exige de quem abraça o sentimento. Exige ponderação, exige aceitação, exige desapego, exige resiliência. Um contente é alguém que mediu as perdas e ganhos e optou por valorizar o lado bom. Um contente, não é um bobo alegre. Um contente observou, analisou e escolheu. Daqui em diante, alguns valores perderam o sentido. Outros tantos passaram a brilhar, até no escuro. Viver a metade de uma vida, te dá a exata medida do que esta por vir. E te dá a certeza de que você pode consertar tudo que não foi bom, você pode viver o que deixou passar, você pode abrir mão do que não era pra ser seu, você pode se vangloriar de feitos e se envergonhar, na mesma medida. Você pode admitir e repudiar, com força igual. Pode fraquejar, pode lutar. Pode abraçar causas, pode chutar o pau da barraca. Pode acreditar, pode duvidar. Você pode tanta coisa, que chega a dar medo.
E ao chegar lá no cume, depois de tudo que passou na subida, depois de tudo que vivera até ali, sentou-se. Merecia aquela pausa, como recompensa pelos esforços empreendidos. Escolheu a sombra da árvore, que tinha a copa mais frondosa. Respirou fundo como se o mundo todo pudesse ser inspirado. Descalçou os sapatos, tirou toda a roupa, soltou os cabelos. Se pôs de acordo com aquilo que sentia. Despiu-se. E olhando ao seu redor, girando vagarosa e atentamente, gritou:
"Tudo meu!" E depois de ouvir o eco reverberando, meu... meu... meu... pegou um espinho, de uma flor que crescia somente ali, naquele época exata, e cortou-se. Fez um corte profundo, pra que a cicatriz fosse certa. Queria ter sempre a lembrança do que vivera até ali. E permaneceu ali até que o sangue formasse uma fina casca. Até que o sol começasse a tingir tudo, a criar sombras. Então, completamente certa do que fazia, pôs-se a beira do penhasco. O vento forte a empurrando pra trás, como querendo demove-la do que estava prestes a acontecer. Como se fosse possível. E assim, esticou os braços, e sorrindo pulou... tendo certeza, contentando-se.



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